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28 de maio de 2010

Entrevista com Rodrigo Cogo

Rodrigo Cogo é graduado em Relações Públicas pela Universidade Federal de Santa Maria, especialista em Marketing de Relacionamento e Comunicação Digital e administra o site Mundo RP. Na entrevista, Rodrigo comenta sobre a importância da FACOS para sua formação, na década de 1990

Que importância a FACOS teve na tua formação profissional?
A passagem por uma instituição pública federal, no início dos anos 90, na minha vida é decisiva para meu amadurecimento como ser humano. O perfil mais humanista e menos instrumental da FACOS foi um ponto extremamente positivo para posicionar melhor aquele grupo de jovens no mundo, e sobremaneira na relevância e na responsabilidade do trabalho que exerceríamos como profissionais no futuro. Fomos uma turma crítica, engajada, comprometida, lutadora e muito efetiva. Mas o entendimento da grandeza do que passávamos, contudo, viria só com o tempo, porque naturalmente que a deficiência dos laboratórios de prática na época nos pareciam um desastre em nossa formação superior, colocando-nos em franca desvantagem em relação a egressos de outras instituições (sobretudo as particulares com suas estruturas tecnológicas de primeira linha). Todavia, logo depois veríamos que o que importava era nossa capacidade de raciocínio, de articulação, de superação, de conexão de ideias, em detrimento da aquisição da habilidade técnica de fazer isto ou aquilo. Sempre levei bastante a sério meu período universitário, até demais em relação a outras vivências que também são fundamentais na estruturação da personalidade, mas ao menos sai do curso com a convicção de deter competências que me legariam boas colocações de trabalho e a realização de minha escolha. Ainda bem que realmente foi assim (e está sendo).

Que características você considera fundamental na formação de um Relações Públicas? Você poderia apontar algumas limitações da profissão?
É difícil traçar o perfil do que seria um "profissional de Relações Públicas excelente", para adotar a terminologia do James Grunig. Mas certamente, ele precisaria ter na sua formação uma dose bastante profunda de estudos relativos a Humanidades - Psicologia, Antropologia, Sociologia, Filosofia, porque no exercício diário da área nos vemos sempre em embates, controvérsias, interfaces com pessoas. Neste sentido, mais do que diagramar um boletim, precisamos saber de relações de poder; mais do que escrever um script de um evento, precisamos compreender os egos e as hierarquias implícitas das estruturas organizacionais; mais do que escrever um texto pro website, precisamos analisar as diferenças comportamentais entre gerações e as mudanças de atitudes a partir das mediações tecnológicas. Como entramos no curso muito novos (em geral, em média), o entendimento é muito pontual, muito factual: fazer eventos, escrever boletins, montar cerimonial, criar um press-kit, viabilizar uma ação cultural... Tudo é muito importante, mas há tomadas de decisão prévias, estratégicas, que este RP precisa fazer parte, sob pena de poder ser substituído facilmente por quem tem outros diplomas ou diploma nenhum.
A outra parte da questão fala em "limitações" do profissional de RP. Bem, terá a limitação aquele que ou não vislumbrar as demandas da sociedade (que são mutantes, ainda mais ultimamente) ou não souber o que fazer com estas demandas constatadas. A questão da leitura de cenários é muito importante e muito presente, e em geral somos pouco capacitados para esta função. As limitações seriam cognitivas, intelectuais e da ordem do empreendedorismo, de ter iniciativa e possibilidade de influência no ambiente organizacional onde estiver prestando serviços. Outro ponto é a dificuldade de tangibilizar o que se faz, porque trabalhamos com questões simbólicas, com percepções de pessoas, com projeção de posicionamentos, e neste sentido ficamos atrás de áreas como publicidade e marketing que se apropriam de resultados concretos para os negócios de empresas e resultados de instituições com maior desenvoltura.

O que te fez sair de Santa Maria e procurar outros mercados?
Minha saída de Santa Maria, onde morei por 22 anos, deu-se pela vontade de frequentar pós-graduação e por desejar fazê-lo fora da instituição onde fiz graduação. Especificamente por querer cursar a especialização em Gestão Estratégica em Comunicação Organizacional e Relações Públicas/Gestcorp, que funciona há 10 anos junto à Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Esta vontade, afora qualquer questão relativa à importância permanente de qualificação profissional, veio de três convites que recebi para ser professor, em instituições catarinenses no ano de 2007, e não pude ser candidato pela falta de estrutura curricular acadêmica. A docência sempre esteve no meu foco, muito embora eu ache que meu encaminhamento para mercado durante estes 16 anos pós-formatura sejam fundamentais para me tornar um bom educador.

Você foi delegado do Conrerp em Santa Maria durante algum tempo, como você avalia a legislação na área, é eficiente? Você acredita que as relações públicas correm o risco de desregulamentação, a exemplo do que ocorreu com os jornalistas?
Não acredito na estrutura oficial da profissão de relações públicas no Brasil, um dos poucos países onde a atividade é regulada por legislação específica e restritora. Sou registrado no Conrerp 2.Região/SP-PR, após transferência do Conselho gaúcho onde estive desde 1994, porque também sou cuidadoso com a lei vigente: se existe o rito de obter diploma e fazer registro em órgão para desempenho profisssional, eu vou seguir - mesmo sendo absolutamente contrário. No período em que fui delegado do Conrerp 4.Região/RS-SC, entre 1998 e 1999, eu acreditava com maior força na possibilidade deste amparo legal significar alguma vantagem para a categoria, o que de fato hoje desacredito completamente. Aliás, pelo contrário, acho mesmo que os Conrerps e o Conferp somente atrapalham o desenvolvimento da profissão por seguirem leis que estão desatualizadas e não acompanham a transdisciplinaridade da área de comunicação, apresentando ao mesmo tempo pouca boa vontade para fazer uma atualização de conteúdos para permitir acesso/registro a graduados em outras áreas do conhecimento, com evidente experiência de mercado, e também para portadores de diploma de pós-graduação em áreas afins a RP. O Conferp parece fechar os olhos para a realidade de que a competência é o grande balizador de mercado, e não um determinado diploma. E, pra terminar de responder, se depender da inexpressividade da categoria de Relações Públicas (como profissão regulamentada) no Brasil, através de suas entidades, penso que pode sim haver algum movimento de desregulamentação também em nosso campo.

Na tua concepção, como as organizações percebem a necessidade e a importância da ação de relações públicas?
A percepção de necessidade e importância sobre a ação do campo de conhecimento das relações públicas nas organizações contemporâneas é muito forte. Estamos numa guerra de narrativas - ganha destaque, repercussão e adesão de públicos a organização que tiver o melhor discurso ou que viabilizar, por inspiração de conduta, o melhor discurso vindo de várias fontes emissoras. Para não haver dispersão de fala e de pontos-de-contato, é preciso um planejamento estratégico de comunicação e a integração das diferentes modalidades que envolvem a áera. Vejo as relações públicas como esta ligação de sintonia, de unidade, de solidez, com ações transformadoras que unam as intenções empresariais ou institucionais (inclusive do lucro) com as demandas e expectativas dos grupos (comunidade, funcionários, governo, imprensa, fornecedores, acionistas, etc).

Considerando que relações públicas é a profissão que mais cresce nos EUA, porque as indústrias multinacionais no Brasil não contratam mais profissionais de relações públicas?
Não sei em que dado esta pergunta está baseada, mas pesquisas realizadas pela Aberje mostram uma absorção interessante de profissionais de relações públicas a cada ano. O que acontece é que os profissionais oriundos do Jornalismo têm mais projeção, reconhecimento de mercado e de habilidades (até por sua exposição de capacidades via rádio, jornal, TV, internet) e portanto são chamados em primazia para determinados postos. O que falta para relações públicas é esta notoriedade de competência.

Como você define o seu trabalho frente ao portal “mundo RP” e como surgiu a oportunidade de realizá-lo?
Meu trabalho no portal www.mundorp.com.br foi sendo alterado com a dinâmica das interações. Tinha como objetivo inicial, em 1997, de ser meu portfólio pessoal digital - no ano de introdução da internet comercial no Rio Grande do Sul. Mas logo na sequência já se mostrou um ponto de encontro de universitários, professores e profissionais de RP e de Comunicação, e também de aspirantes a universitários. Aos poucos, algumas seções foram sendo modificadas, o boletim RP em Ação por email sendo reestruturado em suas pautas e a lista de discussão no YahooGrupos também, para atender a questões de identidade da categoria de RP. Sempre acreditei muito na colaboração, no compartilhamento, no intercâmbio, e as possibilidades da internet só potencializaram isto. A criação do portal se deu como exercício de testagem das minhas habilidades com programação e com criação de textos e hiperlinks/conexões, porque desejava prestar serviços na área - e não tinha capacidade técnica para tanto, ou não tinha a experiência que julgava importante. Troquei o sediamento do meu portal com o então provedor Conex, que depois foi vendido para a multinacional norte-americana IFX, onde passei a prestar serviços de RP - num período de quatro anos. É bom levar em conta que em minha graduação na FACOS não tinha sequer computadores (por uma realidade tecnológica, não por defasagem), e os laboratórios eram feitos de máquinas de escrever de ferro. Daí se vê a necessidade de superação.

Que mensagem você deixa para os acadêmicos de relações públicas da FACOS-UFSM
Que, apesar de outros apelos concorrentes na mesma época (vontades, curiosidades, experienciações, desejos, medos), não deixem de aproveitar ao máximo esta estrutura acadêmica que, apesar de meu distanciamento há vários anos, certamente mantem suas qualidades de apresentar um mundo complexo e instigante. A universidade é só um dos passos na trajetória de alguém, mas não tenham dúvida de que se trata de um momento significativo, com extensões de longo prazo e com uma aprendizagem que se leva pra vida inteira. A gente é muito mais que estudo e trabalho, mas um "estar no mundo" mais responsável requer o desenvolvimento de um olhar sensível e crítico sobre as coisas. A Universidade traz um caminho.


Entrevista realizada por Diego Gabbi e Rogério Saldanha

2 comentários:

  1. Para mim foi um grande prazer conhecer essa pessoa maravilhosa na pós-graduação. Profissional e amigo como poucos.
    Parabéns pela entrevista, Rodrigo!
    Bjs, Juliana Barbieri

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